Foi com muito espanto e algum incômodo que li o artigo da jornalista Érica Fraga publicado na Folha de São Paulo do dia 16/04.
Nele, fala de um estudo ainda a ser publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), de autoria da economista Thais Waideman Niquito e do também economista Adolfo Sachsida no qual afirmam que a inclusão obrigatória das disciplinas de Filosofia e Sociologia, feitas a partir do ano de 2009 "prejudicou a aprendizagem de matemática dos jovens brasileiros".
Como ainda não vi o tal estudo, comentarei apenas a notícia.
Essa inferência acima se deu pela queda na média em redação, matemática e linguagens percebida no ENEM de 2012, feita a partir de um comparativo entre as notas dos alunos que concluíram o Ensino Médio antes da entrada das disciplinas e dos alunos que já estavam sob a nova grade de disciplinas.
Não li no texto da FSP nenhuma menção aos investimentos feitos em Educação Básica durante o período analisado, tampouco a correlação entre a nova grade de horários e a antiga (reduziram horas-aula das disciplinas afetadas? Se houve redução, isso se deu em todos os cenários pesquisados ou em alguma parte deles?) Para um estudo dessa complexidade e uma afirmação tão categórica como a que destaquei acima, imagino que esses dados não poderiam ser deixados de lado.
Mas nem tudo são espinhos, pois se verificou também uma melhora nas notas de português e nas ciências humanas. Porém no geral, as notas em matemática (e em redação) caíram.
Eu digo que sem esse comparativo entre as grades de horários e a distribuição das disciplinas, além da correlação entre recursos investidos nas escolas analisadas, essa conexão mencionada anteriormente é fraca e tendenciosa.
Dito isso, me permito agora ir além do texto e pescar até onde é possível, o contexto no qual a mensagem está inserida.
Numa referência mais abaixo, o economista Adolfo Sachsida diz que observar a carga de tarefas escolares de suas filhas foi um incentivo para que ele pesquisasse o tema. Disse ainda que [a impressão dele é] "o que não dá tempo de ver em sala de aula vem como tarefa para casa". Teria o economista estudado de que forma a inclusão dessas disciplinas tem aumentado incidência de tarefas de casa? Ou se a forma que o planejamento escolar tem sido feito tem gerado esses ruídos entre o que se vê em sala e o que se passa como tarefa para casa? A minha sincera impressão é que o economista não tem o menor conhecimento de como funciona a rotina do Ensino Básico.
Mais adiante, Sashsida ainda procura amparar-se num cenário de socioeconômico para justificar a queda de rendimento dos alunos de baixa renda. Famílias em situação complicada não tem como fazer o acompanhamento adequado dos estudos dos filhos. Por hipótese, a inexistência dessas disciplinas poderia alterar esse quadro positivamente? Eles não respondem no texto e nem sequer levantam a hipótese.
Finalizando o artigo, tem um breve comentário da Ana Inoue ressaltando os benefícios da flexibilização do curriculum do Ensino Médio nestas reformas feitas durante o Governo Temer. Ana Inoue é consultora do Itaú BBA, uma das instituições signatárias desta nova reforma do Ensino Médio.
Seria muito mais decente se com esse artigo viesse com uma tarja de publieditorial.
Trivia
O economista Adolfo Sachsida, segundo informações do site O Antagonista fazia as vezes de conselheiro ao Deputado e candidato a presidente Jair Bolsonaro, durante a breve passagem deste cidadão pelo Patriotas (PEN).
Esse mesmo economista tem perfil (link acima) no site do Instituto Liberal, que tem um texto sobre o Escola sem Partido. Sobre esse movimento e o que ele representa para a nossa Educação, escrevi um artigo a respeito.
Sobre a Reforma do Ensino Médio, rascunhei uma opinião, que você pode ler clicando aqui.
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