Os não-lugares da cidade anafilática

Desde que cheguei procurei transitar. Pessoas, lugares, ambientes, caminhos diferentes. Achava que sempre haveria um porto seguro, um vínculo com algo na minha vida que para além do doutorado me alimentasse uma alegria em estar aqui. Engano meu. Aqui nada é o que parece ser, alias é exatamente a primeira impressão.


Como um lago que de tão límpido parece raso com um fundo pedregoso, quase estéril. Ele é raso. É uma cidade de falsas profundidades, de distâncias fictícias de críticas pleonásticas. Mesmo assim, descobri aqui um amor profundo e eterno e tão complexo quanto refletir sobre a própria existência.


Um amor que não encontrei aqui em um algúem qualquer, foi o não-lugar que é Brasília, o choque anafilático com o modos operanti do anti-amor que destrói os amores do mundo dos que se inserem. Confesso que achei que fosse me contaminar, fosse me sentir brasiliense nos sentidos mais espúrios, mas a cidade por ora não coube em mim e eu não coube nela.


Agora, confortavelmente assentada na minha posição de pária aos que se naturalizam na dinâmica local, me conforto no isolamento emocional que a cidade permite sabendo que é justamente ele que me abre o mundo. Àquele mundo que a capital federal não consegue viver, sentir e ser. A capital, sua concretude armada num espetáculo estético como as relações sociais que ela cria, nutre e predomina.


Se eu me sentia Mersault pela incapacidade de encaixar/compreender, hoje eu escolho o labirinto do Eremita: minha jornada de desafios internos e externos; meu cajado das limitações que carrego e reconheço cotidianamente; e meu olhar no horizonte que não destrói. Minhas asas não precisam me levar ao Sol, podem me deixar apenas pairar sobre a relva.


Deixei o não lugar para o meu lugar onde a cidade não cabe. A geografia deixa aqui de ser relevante, e a gelidez brasiliense também. Os planaltos são hoje condições geográficas conjunturais que, por ora, me propiciam um belo por do sol, e manhãs bucólicas.


O resto, é resto…se há gente por aqui..sim, um bocado. Mas não senti pessoas.